CENOGRAFIA

PRODUÇÃO DE PONTA A PONTA
CENOGRAFIA
Por Célio Inada

Costumo dizer que a cenografia, por vezes, tem a função de “enganar” o público. Calma! Eu explico.

Com certeza, alguém um dia já viu um filme ou uma novela em que alguns cenários continham texturas de ferro, tijolo ou pedra por exemplo. Na maioria das vezes, essas texturas podem ser cenográficas – ou seja, compõem a cena de forma alusiva – e também podem ter características realistas ou lúdicas.

Em cenografia essas texturas têm a função de esconder, através de efeitos e pinturas especiais, os materiais nos quais foram realmente construídos. Por exemplo, uma parede de pedra: nada mais é que um painel construído em madeira revestida com isopor, modelados em forma de pedras e acabados com pintura de arte, imitando cores, efeitos do tempo, sujeiras e outros.

Mas a cenografia não se limita apenas à teledramaturgia, ao teatro ou cinema. Está presente em eventos, congressos, shows, musicais, telejornal, programa de entrevistas, debates, programas infantis, programa de variedades, etc.

A criação
Para que o cenógrafo possa criar um cenário, é preciso que o diretor faça um “briefing” de como será o programa em questão.

Neste perfil são necessárias as seguintes informações:
• O tipo de programa, se é musical, telejornal, variedades, eventos, dramaturgia, etc.
• A quantidade de pessoas que estarão no cenário, apresentadores, entrevistados, músicos, convidados, platéias, etc.
• Ter informações sobre o roteiro do programa.
• Dimensões do estúdio ou o local a ser montado. Se o espaço for desconhecido, é aconselhável fazer uma visita técnica a fim de se obter medidas exatas e ter conhecimento das características técnicas e acessos do estúdio.
• Quantidade de câmeras
• Público alvo
• Horários de exibição do programa
• Existência ou não de definições gráficas, como logotipos e vinhetas.

Com todas essas informações, o cenógrafo cria um espaço adequado para o programa, alinhando transversalmente o design, as cores, o espaço cênico, a roteirização, a iluminação e o espaço operacional. Faz-se, então, os primeiros traços para a definição plástica.

O desenvolvimento do projeto
Após definidas as diretrizes plásticas e físicas do cenário, faz-se o projeto técnico, ou seja, tudo é produzido em escala reduzida (normalmente 1:50 – relação que indica a proporção em que o desenho está sendo produzido). Neste exemplo, 1:50 significa que para cada 1 cm desenhado no papel, consideramos que teremos 50 cm na realidade. Conforme as necessidades, podemos aumentar ou diminuir essas escalas que podem ser 1:25 , 1:20, 1:5, 1:2, 1:100, 1:200, 1:500.

Utiliza-se normalmente o Autocad para esse fim, mas existem muitos cenógrafos que ainda preferem o desenho manual na saudosa prancheta com régua paralela, lapiseira e esquadros.

Na seqüência do projeto técnico, escolhemos uma maneira de apresentação desse projeto para aprovação junto ao diretor ou cliente. Existem diversas formas de se apresentar um projeto, tais como:
• Perspectivas feitas à mão livre, pintadas com giz de cera, lápis, canetas hidrocor, tinta guache ou então aquarela.
• Maquetes físicas, construídas com papel do tipo paraná, cartão, fabriano, arames, madeira balsa, cola branca, tinta látex, plásticos, acrílicos ou o que o maquetista definir.
• Maquetes eletrônicas que são modeladas através de um programa de computador. Existem no mercado vários modeladores eletrônicos, tais como 3D Max, Sketchup, Rhinoceros, Revit e Autocad.
• Montagens fotográficas que podem ser executadas em algum editor de imagens como Photoshop, Corel Draw, Adobe Ilustrator.

Figura 1: Navio – Programa Direções – Peça: A longa viagem – TV Cultura

Custo do projeto
Este item é super importante, pois muitas vezes é o ponto decisivo para a viabilidade ou não do projeto.

Pode-se, no momento do briefing, tentar sentir a capacidade de investimento no cenário, pois isso ajudará o cenógrafo a criar parâmetros em relação às dimensões e escolha de materiais a serem utilizados no cenário.

Normalmente monta-se uma planilha no programa Excel, onde colocamos a quantidade, preço unitário, preço total de cada item a ser utilizado no cenário.

Uma planilha bem detalhada, com especificações de materiais e referências em conjunto com o desenho técnico bem definido, faz com que a construção tenha um ritmo mais dinâmico. Muitas vezes, diminui-se o tempo de construção, pois não se perde tempo com dúvidas em relação às espessuras , cores ou bitolas na hora da compra desses itens.

Construção e montagem
Após as devidas aprovações junto ao diretor, inicia-se a fase de construção do cenário.

Os profissionais dessas construções são os cenotécnicos. São marceneiros voltados para essa área de cenografia e eventos, cuja técnica construtiva difere das construções de móveis.

Mesmo com todos os desenhos técnicos e especificações do cenário, é importante o acompanhamento pontual durante essa fase.

O projeto pode sofrer alterações a pedido do diretor ou por questões estruturais, e nesse momento o cenógrafo tem que ter soluções rápidas sem que agrida o projeto inicial.

Muitas vezes o projeto pode estar “bem resolvido no papel”, mas no momento da montagem, por questões de impossibilidades das préavaliações do espaço, imprevistos acontecem como, por exemplo, uma caixa de luz que não pode ser obstruída ou o difusor do ar condicionado tem que ficar livre.

Algumas adaptações são perfeitamente normais, durante a montagem o cenógrafo, juntamente com o diretor, pode criar novos planos de câmeras.

O diretor de fotografia também pode solicitar algumas adaptações. Uma iluminação bem afinada com a dosagem correta de luz e sombra pode criar “climas”, ambientes, dramatizar cenas e valorizar muito mais o cenário.

Gravações
Os programas, de um modo geral, podem ser gravados ou ao vivo.
Em ambos os casos, a presença do cenógrafo ou do seu assistente é muito importante, devido a algumas trocas de cenário ou atendimento durante as gravações.

Como espectador
A cenografia é uma arte efêmera, que tem uma velocidade muito grande no seu acontecimento. Ela é registrada em fitas ou, mais atualmente, em HD’s, mas fica na lembrança da emoção e do momento do espetáculo.


Figura 2: Cozinha: Programa Direções – Peça: O telescópio – TV Cultura

* Célio Inada é cenógrafo da TV Cultura – email: [email protected]

Revista da SET – ANO XXI – N.115 – JUL/AGO 2010