Nova Sede da Globo em Recife: Tudo em IP

por Roberto Menezes

 

Fonte: Mercado no Ar/Globo Nordeste

A Globo de Recife iniciou em 2014 a construção da sua Nova Sede, localizada na Rua da Aurora, centro da cidade. Projeto grandioso e desafiador, em meio à crise que estava prestes a instaurar-se. Embora um prédio totalmente novo, seria um projeto de migração, onde seriam transferidos todos os ativos da antiga sede, localizada em Olinda, no Morro do Peludo, para o novo prédio.
A equipe da Tecnologia, sempre atenta à evolução do mercado broadcast, iniciou os estudos do IP. Mesmo esta tecnologia ainda estando em desenvolvimento, a equipe conseguiu mostrar à direção que não seria válido ter uma infraestrutura em Banda Base na Nova Sede de Recife. E, com isso, a Globo de Recife transformou um projeto de transferência em um pioneirismo, tornando- se a primeira emissora da América Latina com o fluxo em IP.
Foram traçadas algumas premissas ao projeto, associadas aos benefícios de se ter uma infraestrutura totalmente em IP. Como Recife seria uma nova emissora, a principal premissa era que a infraestrutura estivesse preparada para o futuro, apta a trabalhar com qualquer padrão, formato de vídeo, que venha a surgir. Para não ocorrer o que aconteceu no passado, onde na migração do analógico para o digital os Broadcasts tinham que substituir toda a infraestrutura das emissoras, trocando além dos equipamentos todo o cabeamento. Assim também acontecia nas migrações do SD (Standard Definition) para o HD (High Definition). Com isso, optou-se por fazer todo o cabeamento entre salas técnicas e operacionais em fibra óptica.  

Fig. 1 – Topologia de rede utilizada
Fonte: Roberto Menezes

Padrões
No início dos estudos o padrão para video over IP ainda estava em desenvolvimento, ainda não existia um padrão realmente consolidado no mercado, além de muitos fornecedores trabalhando com formatos proprietários. A interoperabilidade não era premissa dentre eles, o que ia de encontro à proposta da solução IP.
Verificou-se que o sistema estava bem definido para um workflow com o áudio e o vídeo embedded, utilizando o SMPTE (Society of Motion Picture and Television Engineers) 2022. No entanto, o 2022-6 não fazia a comutação seamless entre as streams nos gateways. Isso só veio ocorrer no 2022-7.
No evoluir dos estudos surgiu a TR-04 (Technical Recommendation) publicada pela VSF (Video Services Forum), uma recomendação que tornou possível trabalhar o áudio separadamente do vídeo, em streams distintas. O vídeo continua sendo encapsulado no SPMTE 2022 e o áudio passa a ser encapsulado em uma stream AES-67. Na sequência, a VSF publicou mais uma recomendação, a TR-03, onde a stream de áudio também é no padrão AES-67, mas a do vídeo é na RFC 4175, o que otimiza a banda pois ela só transporta pixels ativos. A expectativa do mercado é pela publicação do SMPTE 2110, que virá para padronizar o formato de transporte do Sistema IP.

Estrutura do sistema IP
O Sistema IP é composto de gateways (para infraestruturas que precisam converter o SDI para IP), Switches de rede de alta performance e servidores SDN (Software Defined Network). Os gateways têm a função de converter os sinais de SDI para o IP e do IP para SDI, esses elementos são necessários para o uso de equipamentos legado, em banda base. A interface IP é conectada ao switch de alta performance, e todos os sinais, antes em SDI, passam a estar em IP dentro da grande Rede. Os servidores SDN fazem a gerência e controlam todo o fluxo de sinais dentro da Rede IP.
A SMPTE estruturou a norma para que o padrão fosse totalmente redundante, com isso, cada gateway possui dois (2) streams idênticas, sempre ativas, e as enviam para duas redes completamente separadas. O que dá a possibilidade de redundância em caso de qualquer falha em uma Rede IP, pois a outra rede assume imediatamente, sem interrupção do sinal. Um exemplo da topologia pode ser visto na figura acima.
Dado que o SMPTE 2110 ainda não foi publicado e ainda não teve como ser implementado nos equipamentos, a arquitetura do Sistema IP da Nova Sede de Recife foi dividida em duas formas de trabalhar, 2022-7 e o TR-04. Na exibição, o fluxo da está em 2022-7, pois nesta área só se trabalha com sinais embedded, e a produção está em TR-04, pois é imprescindível ter a flexibilidade para manipulação dos canais de áudio e do vídeo nesta área.

Referência
A referência é algo extremamente importante. O PTP (Precision Time Protocol) é a referência do sistema IP. O gerador de PTP fornece a referência para os switches do sistema IP e estes disseminam para toda a rede. O PTP é necessário para o funcionamento da Stream AES-67. Caso o broadcast trabalhe apenas com o 2022, existe a opção de continuar trabalhando com o Black referenciando os gateways do sistema.
Com relação à arquitetura de Rede, a Globo Recife optou por utilizar a topologia Spine-Leaf, que possibilita o crescimento do sistema de acordo com a necessidade, diferente do sistema em Banda Base, onde era necessário adquirir uma matriz de vídeo exatamente com a quantidade necessária para a emissora ou uma matriz prevendo uma expansão, o que muitas vezes não acontecia e a matriz ficava obsoleta e o recurso não era utilizado com otimização. A arquitetura é completamente redundante e possuem 2 redes spine-leafs independentes, que recebem simultaneamente as streams dos gateways.
Os Leafs, possuem portas de 10Gb que se conectam aos gateways e portas de 100Gb que funcionam como Uplink para o Spine, que é todo em 100Gb, conforme figura acima.

Conclusão
A Tecnologia IP tem se mostrado cada vez mais forte no mercado Broadcast e tem provado que veio para ficar. A Globo Recife expõe em seu projeto o quão acertada foi a decisão de investir nessa infraestrutura, que já está preparada para a evolução dos padrões, seja 4K, 8K ou o que surgir nos próximos anos. A otimização no cabeamento é algo impressionante, pois no mundo banda base, cada sinal em HD utiliza um cabo SDI. No sistema IP, um simples cordão óptico trafega até 8 sinais HD, a depender dos SFPs utilizados nos gateways e switches. É uma redução de cerca de 80% no volume do cabeamento. Além disso, a tecnologia oferece a possibilidade trabalhar com equipamentos já consolidados no mercado, como switches que atendem redes do mundo todo, ao invés de um nicho especifico como o de broadcast. Também possibilita a interligação de sites e interligação de operações, pois basta colocar um switch em outro site na mesma rede que está o sistema IP e este site terá a possibilidade de ter qualquer sinal daquela Rede.
O que fica claro também é a mudança do perfil do Engenheiro da Televisão. Antes limitava-se aos conhecimentos sistêmicos do vídeo, hoje terá que se conciliar com o mundo da TI. Sem dúvidas o futuro já chegou, e a ITização acompanhada de muitos benefícios tem substituído o fluxo de distribuição em banda base.

Equipe: Roberto Menezes, Fábio Madeira, Alexandre Tauhata, Marcelo Rios, Fontinele Mizuno, Débora Leite, Thiago Abreu, e Carolina Duca

Roberto Menezes Roberto Menezes
Roberto Menezes é graduado em Engenharia Elétrica de Telecomunicações na UPE (Universidade Estadual de Pernambuco), está na Globo há 5 anos. Iniciou sua carreira como estagiário na TV e hoje é Supervisor Executivo de Sistemas de TV, e líder do projeto da Nova Sede. Estudou a fundo as soluções de IP disponíveis no mercado e tem como missão entregar a Nova Sede da Globo em IP, além dos demais desafios demigração. Contato: [email protected]