A TV Digital e os caminhos do engajamento da audiência

Nº 144 – Agosto 2014

Por Dimas Dion

ARTIGO

empoderamento do controle remoto e dos outros dispositivos à disposição vem alterando de um comportamento antes passivo, para agora cada vez mais dono da decisão do que vai consumir.
A produção da programação do conteúdo televisivo tem-se deparado com desafios nunca antes imaginados pela maioria dos profissionais da área, e nem por muitos cientistas do mundo da comunicação. Cada vez mais conectada e ávida de transcender sua sala de estar, a audiência já há alguns anos vem se utilizando de microblogs para tornar suas opiniões públicas.
Um dos motivos para a adesão desse comportamento se dá pela fidelidade da audiência sobre a programação da qual interage. Enxergamos nisso uma grande oportunidade das emissoras de manterem a atenção da audiência na tela da TV. Os aplicativos de Segunda Tela surgiram sem fazer barulho e rapidamente ganharam a aprovação do público, isso porque trazem embarcados conteúdos em uníssono com a televisão.
As modalidades de interatividade da TV com o público e vice-versa são muitas. Como exemplo temos a utilização do Ginga, TV conectada, aplicativos das emissoras para smartphones de um lado e as mídias sociais do outro lado. De todas as subcategorias de interatividades que as mídias descritas acima propõem, pouquíssimas não dependem da internet, seriam o Ginga e as mensagens de texto via smartphone. Mesmo com a crescente penetração destes dispositivos no mercado e as vendas das televisões conectadas, grande parte da população nacional ainda não possui banda larga ou internet sem fio.
Sendo assim, existe uma encruzilhada entre atender a universalidade e a demanda de um público antenado em novas mídias associadas ao broadcast. A terceira via para essa encruzilhada pode ser proposta associando as ferramentas transmidiáticas no modelo de negócio broadcast. Acreditamos que estamos em uma Era em que as pessoas possam curtir, interagir, compartilhar e co-criar conteúdos dando poder à voz da audiência.
O grupo de estudos EraTransmidia dispõe em sua definição de que a partir de um conteúdo principal envolvente, distribuído em múltiplas plataformas de mídia utilizando o melhor de cada uma delas, que gere interesse e visibilidade mantendo a atenção e engajamento das pessoas, permitindo que novos conteúdos sejam produzidos pela audiência, que busque resultados positivos ou êxitos, levando à transversalização se tornando um fenômeno. Este fenômeno é exatamente a resposta que as emissoras buscam: manter a rentabilidade, aumentar a penetração dos conteúdos sem perder a audiência na programação do fluxo televisivo. O mercado vive um panorama de audiência heterogênea, ora generalista ora buscando um nicho. Independente de classe social, gênero ou localização demográfica. O zapping saltou da tela da televisão e agora envereda por novas fronteiras. Conforme apontam Hyman e Sheatsley: “Pressupor uma correspondência perfeita entre a natureza e a quantidade do material apresentado numa campanha informativa e a sua absorção por parte do público, é uma perspectiva ingénua, porque a natureza real e o grau de exposição do público ao material informativo são, em grande parte, determinados por certas características psicológicas da própria audiência”. (1947, p. 449)
O fenômeno conhecido como TV Anywhere inclui as redes de telecomunicações, além da Internet, TV a cabo, TV via satélite. A escolha por parte das equipes de Desenvolvimento e Planejamento Estratégico das emissoras ditarão os caminhos e o alcance de suas iniciativas perante o público. Lançando mão de pesquisas de mercado, técnicas de experiência do usuário (UX), fábrica de testes entre outras ferramentas se tornam vitais para que o desenvolvimento dos projetos de interatividades alcance seus êxitos. Os estudos analíticos desses dados podem prever tendências de novas mídias. Como os projetos costumam ter um ciclo de vida acima de um ano até o lançamento, essa análise deve ser feita com bastante propriedade e por profissionais que tenham o perfil de um cargo ainda novidade no Brasil, o produtor transmídia.
Este profissional já está atuando nas emissoras com nome de cargos bastante diversos de produtor transmídia, acreditamos que ele deve associar uma série de características para um projeto de sucesso, entre eles: estar conectado com o roteirista / jornalista, conhecer as plataformas de mídias, integrar as equipes: criação/tecnologia/ comercial, conhecer ferramentas transmídiaticas, abrir canais de comunicação com a audiência, estudar cases, ter sempre inovação entre seus valores intrínsecos.
Os limites de cada uma das plataformas e da penetração das mídias no público-alvo escolhido e identificado, deve acompanhar a cultura tanto da emissora como a do público. Isto porque, a comunicação da emissora é retrato de sua marca. A marca é aquilo que ela comunica ao mundo o tempo todo, e a fidelidade do público está associada ao quanto ela se identifica com a comunicação.
O consumo da televisão por parte da audiência na realidade atual e a utilização de várias telas ao mesmo tempo vem impulsionando o mercado de aplicativos. Tão importante quanto o conteúdo que virá embarcado nos aplicativos é a experiência sensorial associada a eles. Essa experiência tende a ativar o público para a programação na tela da televisão. Com os holofotes virados para si, este setor poderá movimentar 6 bilhões de dólares até 2017 segundo apresentados no 2nd Screen Society.
Entre as formas de gerar engajamento do público podemos listar fenômenos espontâneos (em que a própria audiência origine) ou planejados (criados pelas emissoras). Em ambos os casos, a característica comum é da falta de controle do que será produzido pela audiência.
O exemplo mais recente foi o recorde de mensagens no microblog Twitter na final da copa do mundo de futebol. A final do Superbowl (campeonato de futebol americano) era o detentor do recorde com 382 mil postagens por minuto contra 618 mil postagens por minuto no momento que a seleção alemã foi declarada campeã totalizando 32 milhões de tuítes interagindo com um evento esportivo transmitido pela televisão convergindo em um fenômeno espontâneo transmídia.
Com relação especificamente com as iniciativas planejadas pela emissora. As tecnologias utilizadas poderão ser além daquelas associadas às mídias sociais, desenvolvendo aplicações onde complexas combinações serão usadas. Os aplicativos podem ser desde mais genéricos acompanhando toda a programação da emissora como na iniciativa da TV Cultura em 2013, quanto produção original para cada programa como Hannibal (NBC/ AXN) e mais recentemente Superstar (Rede Globo). Esses exemplos são a ponta do iceberg por trás de inúmeras outras tecnologias e formatos de convites para participação do público que a EraTransmídia pesquisa e desenvolve.
O fluxo pode ser aberto tanto por um simples aviso de despertador de calendário, até interfaces por e watermarking e fingerprinting (marca d´agua e impressões digitais). O watermarking, nada mais, é que um sinal de áudio extra que é misturado com a trilha sonora do programa, e usando as propriedades particulares do ouvido humano, é muito fácil de esconder informação de que o ouvinte não consegue detectar, mas um microfone ainda pode. Enquanto o aplicativo pode pegar o sinal de marca d’água, ele pode dizer o que você está assistindo e sincroniza rapidamente trazendo um conteúdo push no dispositivo novo.
Já no fingerprinting, se você analisar uma trilha sonora de áudio, você pode reduzir estas frequências e amplitudes em um conjunto de identificadores, e a relação entre eles cria uma assinatura única para que parte do conteúdo. Se você, em seguida, capturar essa mesma trilha sonora em seu tablet ou smartphone microfone e realizar a mesma análise, você pode combinar os dois resultados e descobrir o que você está assistindo. Não importa se é mais alto ou mais baixo, ou se há um pouco de ruído de fundo, desde que a relação entre os componentes ainda é o mesmo.
Acreditamos que o segredo do sucesso seja a união entre tecnologia a busca pelo engajamento do público na garantia de que consumirão o conteúdo e acompanharão os anunciantes. Nuno Bernardo, produtor português premiado com Emy descreveu como alcança o engajamento do seu público suas palestras e seu livro. Segundo ele, as audiências reagem bem a quatro estímulos de engajamento específicos: status na comunidade, diversão, recompensas e causas.
Status, para dar notoriedade para os fãs mais ativos, convidar a audiência a criar junto com a produção de materiais extras, participar de alguma ação de marketing e ouvi-los respondendo diretamente na rede dos consumidores.
Diversão, criando enquetes, aplicativos com jogos, utilizando arcos de comédia dentro do projeto que gere interação do público. Esses são exemplos para criar diversão até mesmo em um programa televisivo dramático.
Recompensas aos fãs, concursos culturais, sorteios para assistir sessões exclusivas e badges que os fãs possam usar nas redes sociais.
E as causas que são fatores que geram rápida assimilação e envolvimento. As causas podem ser políticas, sociais ou humanitárias, é importante que o tema seja de importância genuína para o projeto, pois a nova geração da audiência não perdoa fácil o uso oportunista de temas tão delicados.
Conquistar a audiência nessa nova Era da comunicação não corresponderá simplesmente em demonstrações de domínio de alta tecnologia, e sim no conjunto de fatores descritos nos conceitos da Era- Transmidia nos quais: observação do comportamento da audiência em suas diversas mídias, simplicidade no uso das plataformas e relevância do conteúdo. A adesão de equipes multidisciplinares nas emissoras e produtoras é grande valia para construção de projetos que representem vários pontos de vista da sociedade.
A mira não é somente os pontos de audiência durante a programação, é toda construção da cultura de um programa, de uma emissora ou até da sociedade inserida no contexto do conteúdo desenvolvido.

Colaboração: Rodrigo Arnaut e Daiana Sigiliano

Referências Bibliográficas
ARNAUT, R. et all Era Transmídia. In: Revista GEMINIS ano 2 – n. 2. São Carlos, 2011. Disponível em:http://www.revistageminis.ufscar.br/index.php/geminis/article/view/93 BECKER, V. Ambiente de Medição da Audiência para TV Digital. 2011. 248f. Tese (Doutorado em Engenharia Elétrica) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2011.
HYMAN, H.; SHEATSLEY, P. 1947, Some Reasons Why Information Campaigns Fail. In: Public Opinion Quarterly, vol. II, pp. 412-423 (reeditado in Schramm-Roberts (eds.) 1972, pp. 448-466).
SHIRKY, C. Lá vem todo mundo: o poder de organizar sem organizações. 1° Edição. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 2012 Disponível em: < http://www.2ndscreensociety.com/research/ >. Acessado em: 24/06/2014.
WOLF, M. Teorie delle Comunicazioni di Massa, 5 ª edição, Lisboa, Setembro, Ed. Presença, 1999. BERNARDO, N. The Producers Guide to Transmedia. Disponível em Acessado em 12/06/2014 Acessado em 14/07/2014

Dimas Dion é psicólogo, especialista em branding e gestão de projetos e membro do Grupo EraTransmídia.

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